Você sabe o que é desgosto? Em Guiné-Bissau, onde a expectativa de vida é em torno de 48 anos, o desgosto é uma parte constante da vida. Quando estive em Bissau, no meu segundo mês de missão, recebi a notícia de que minha avó estava internada, pouco tempo depois ela morreu. A dor de estar longe de casa sem poder estar com minha família foi profunda. No entanto, a maneira como os guineenses lidam com o luto me ajudou a entender melhor o conceito de desgosto. Acabei encontrando uma relação direta entre desgosto e esperança. Essa é uma mensagem de conforto.
Ser forte é não mostrar dor?
Os guineenses, assim como os motilones descritos por Bruce Olson em “Por Essa Cruz Eu Morrerei”, enfrentam o desgosto de maneira reservada e silenciosa. Olson descreve os Motilones como “duros como ferro”, o que reflete uma cultura que valoriza a força emocional e a contenção das lágrimas. Os guineenses são ensinados desde cedo a serem fortes. Lembro-me de uma cena em que uma criança se machucou e, ao chorar, foi repreendida por uma criança mais velha que acreditava que ser forte significava não mostrar dor.
Apesar dessa contenção, algumas pessoas choram. Só que é um choro cantado. Inclusive, há uma moça que passa pela casa inteira entoando esse lamento, quase como uma canção que expressa a dor de forma melódica, fazendo parte do ritual de luto e demonstrando que o sofrimento não precisa ser totalmente silencioso. Essa prática me marcou profundamente, pois reflete uma maneira cultural de lidar com a perda, onde a dor é transformada em um canto que ecoa pela comunidade. Se o desgosto não estiver ligado a esperança, uma poderosa mensagem de conforto é perdida.
Qual o papel do missionário?
Recentemente, no Brasil, recebi uma mensagem de um aluno muçulmano informando que ele havia perdido o pai. Essa notícia trouxe de volta todas as minhas experiências em Guiné-Bissau e reforçou a importância do nosso papel como missionários. É fundamental oferecer apoio e conforto aos que enfrentam a dor, mesmo que isso signifique simplesmente estar presente.
Quando ainda estava em Guiné vivi uma experiência marcante, quando um desbravador perdeu seu pai um dia antes do Dia dos Pais. Recebemos a notícia e fomos ao desgosto, que é a cerimônia de luto, para prestar apoio. Lá, vimos nosso desbravador, que ainda era uma criança, enfrentando a perda de seu pai em um momento tão próximo do Dia dos Pais. Esse contraste foi doloroso para nós. Então eu e outros missionários choramos juntos, compartilhando a dor e a tristeza.
A presença pode ser o maior consolo
Foi muito interessante observar que, na segunda semana após a perda de seu pai, esse desbravador estava na frente da igreja liderando o louvor. Ele, que havia sofrido tão profundamente, estava trazendo esperança para os outros. Esse momento me ensinou muito sobre como, apesar da dor e do sofrimento que enfrentamos, nossa missão é trazer esperança, ainda que cansados e enfrentamos desafios. Vi claramente como o desgosto deve estar ligado a esperança para produzir uma mensagem de conforto. Em um país com pobreza e questões culturais complexas, percebemos a profunda necessidade de esperança que as pessoas têm. Como resultado, nossa missão deve ser ensinar que existe um Deus que ama e que enxugará todas as lágrimas.
Da mesma forma, quando uma desbravadora perdeu seu pai, tivemos que cancelar um clube de desbravadores para comparecer à cerimônia de luto. Chegando lá, as crianças se sentaram no chão, como uma forma de mostrar solidariedade. Embora não visse lágrimas no rosto dessa desbravadora, compreendemos que a presença e o apoio eram o mais importante naquele momento. A cultura local valorizava a presença como uma forma de consolo e nós aprendemos que, às vezes, estar lá para alguém é o maior conforto que podemos oferecer.
Desgosto e Esperança: Uma Mensagem de Conforto
Quando passei por um momento semelhante, meus alunos junto com meu líder, fizeram um cartaz com mensagens de conforto e apoio para mim. Mesmo estando distantes, essas palavras escritas me trouxeram um grande consolo e demonstraram o carinho e a solidariedade que eles sentiam por mim. Embora não pudessem estar fisicamente presentes, suas mensagens foram um lembrete poderoso de que eu não estava sozinha na minha dor.
Como missionária da AFM, nosso objetivo é alcançar aqueles que ainda não conhecem a mensagem de esperança e consolo, independentemente de sua crença ou cultura. Portanto, nossa missão é oferecer uma mensagem universal de que, um dia, não haverá mais tristeza, dor ou choro. “O Cordeiro que está no meio do trono os apascentará e os guiará para as fontes da água da vida. E Deus lhes enxugará dos olhos toda lágrima”(Apocalipse 7:17).
Deus oferece consolo eterno
Essa mensagem é para todos que enfrentam a dor e o luto, sejam eles de qualquer cultura ou fé. Porque todos nós precisamos saber que há um Deus que oferece consolo verdadeiro e eterno. Deus, nosso Pai celestial, promete um futuro onde o desgosto e a tristeza não existirão mais. Ele conhece cada lágrima e entende cada sofrimento, e nos oferece a esperança de que um dia, toda dor será removida.
Então que esta mensagem possa trazer conforto e lembrar a todos que há esperança além da nossa compreensão imediata. Pois Deus é o nosso Pai, que cuida de nós e nos promete um futuro sem lágrimas.
Tamily Ramos serviu como missionária no Projeto Geba durante o ano de 2023.